17.5.10

Sala de espera

Na sala de espera, não se pode falar alto. Não se pode dançar, cantar, às vezes nem conversar. Não se pode mudar o canal da TV ou trocar o tipo de revista. Não se pode olhar o outro sem constrangimento.

Mas pode beber água ou quem sabe café. Pode sentar, ficar parado, ouvir o telefone tocar. Olhar num ponto fixo, pode pensar. Sentir-se aflito, abandonado. Pode também rezar.

É pouco que podemos, na sala de espera, senão esperar.

3.5.10

Impossível

Quando visualizei Nádia sentada no banco mais escondido do jardim, eu sentia tudo, menos raiva. Ela chorava inconsolável a traição recém descoberta, isolando-se na humilhação que sentia. Pouca luz chegava àquele ponto, mas era possível enxergar claramente a dor através da expressão contorcida.

- Estou procurando por você há meia hora – anunciei minha chegada, para não assustá-la. Mesmo assim, percebi um sobressalto delicado, como todos os seus modos habituais.

- Olá, Pedro. – disse ela, limpando lágrimas das bochechas.

Ela estava linda. Eu jamais lhe diria isso, pois era um momento terrivelmente inconveniente para tais gentilezas. Porém, não pude deixar de pensar como a tristeza lhe iluminava. Seus olhos pareciam duas belas pérolas negras, brilhando em melancolia.

- Você está bem? – perguntei, ciente dos últimos acontecimentos da festa.

Ela parecia exausta. A maquiagem havia sido lavada pelas lágrimas, o vestido estava arruinado pelos galhos secos e os sapatos, cobertos por borrões de terra. Eu gostava de vê-la assim, tão naturalmente composta, como uma obra de arte visceral. Minha mãe, porém, jamais a deixaria voltar para o salão da casa principal.

Em resposta à minha pergunta, ela soltou um suspiro tremido e cheio de mágoa. Quando percebi que ela voltava a chorar, sentei-me a seu lado para acudi-la. Contornei seus ombros com meu braço e ela se aninhou em meu peito. O calor que seu corpo emanava era aconchegante; a proximidade me causava uma sensação divina. No entanto, de toda aquela intimidade, era o toque de sua pele que arrepiava os pêlos de meu corpo.

- Você está com frio? – ela perguntou. Eu não respondi. Apertei-a contra mim e desejei que aquele momento durasse para sempre.

Em alguns minutos, o ritmo de sua respiração era mais calmo. Perguntei-me o que estaria pensando; se era em mim, seu ombro-amigo. Se ela agora me via como algo além disso; se ela sentia, como eu, aquela ligação especial que tínhamos. Se gostaria de me beijar. Nesse instante, ri de mim mesmo. Aquilo era impossível e eu sabia. Ela jamais me veria da maneira que eu desejava.

- Eu não vou voltar à festa. Eu não posso. – sua doce voz falhou, então tomou fôlego para continuar – Ele ainda está lá. Com ela.

- Você não deveria se envergonhar, Nádia. – eu disse, me enchendo de ódio contra o homem que a tratava tão mal – É ele que deve ir embora e nunca mais voltar.

- É uma questão de interesse, Pedro. Ele e sua família sempre serão sempre bem-vindos em qualquer lugar. – retrucou ela, desanimada.

Mais algum tempo ali, junto dela, e comecei a sentir que éramos um só. Unidos no bater do coração, sincronizados como deveriam as almas gêmeas. Ela estava tranqüila; eu não poderia estar mais orgulhoso. Toda vez que eu fazia algo por Nádia - minha Nádia - eu sentia que ela me pertencia inteira. E que nenhum outro homem neste mundo poderia cuidá-la melhor.

Quando ela se levantou para ir, eu a segurei pelo pulso. Esse era sempre o momento mais doloroso. Eu sabia que se a detivesse delicadamente, ela se viraria para sorrir uma última vez. Também sabia que ela colocaria um fim naquele momento terno.

- O que foi, meu irmão? Precisa de alguma coisa?

- Não, minha querida. – eu desmoronava por dentro - Eu aviso nossa mãe que você resolveu se recolher.