19.2.12

Bagagem

Quando Tatiana surgiu no começo da rua, primeiro vi um ponto verde em meio ao intenso branco da neve e, depois, fui distinguindo seu velho gorro em forma de sapo. Antes mesmo que ela alcançasse o quintal de minha casa, vesti o casaco e saí correndo pela porta da frente, deixando-a aberta (para desgosto de minha mãe).

- Oi - parei a mais ou menos 1 metro dela e sorri, ofegante.

Ela parou de caminhar e lançou um olhar grave. Meu coração acelerou.

- Oi - respondeu, timidamente.

Havia dois dias que eu esperava ansiosamente por aquela visita. Na verdade, não sabia realmente se haveria uma visita. Talvez fosse um telefonema, talvez uma carta. Talvez apenas um e-mail. Talvez até mesmo nada. Mas depois de 48 horas de pura agonia e especulação, lá estava ela, olhando diretamente para mim.

- Você... er... leu minha carta? - perguntei, depois de alguns longos segundos de silêncio.

Ela confirmou com a cabeça e abriu a boca para falar. Nada saiu.
Em instantes, seu rosto ficou muito vermelho. Ela retirou um pacotinho de pano do bolso do casaco e enfiou na minha mão. Havia um punhado de bolinhas de chocolate dentro dele.

- Eu não posso namorar até completar 18 anos. - ela disse, com a voz trêmula e o rosto ainda mais vermelho - Mas o chocolate vai ajudar você a não ficar triste. Minha mãe que disse.

Não havia chocolate no mundo que pudesse amenizar a tristeza que inundou meu peito naquele momento. Mas me forcei a sorrir e, antes que pudesse dizer alguma coisa, vi ela se virar e correr para longe.

Senti o abandono e a solidão congelarem meus ossos. Sobrou apenas neve e tudo ficou branco. Um branco puro, limpo e claro. Tão claro que fazia doer os olhos.

Por isso, demorei até conseguir visualizar o rosto de Alex no fim do corredor. O vestido branco refletia o belo Sol de primavera e balançava com leveza ao ritmo da brisa. A marcha nupcial soou bonita e imponente. Todas as cabeças estavam voltadas para ela, enquanto caminhava lentamente sob murmúrios de elogio e admiração. Alex era adorada por cada dos presentes, inclusive entre os meus convidados.

Quando nossos olhares se encontraram, meu coração ficou morno e calmo. Havia nela tudo o que eu poderia desejar em uma mulher: beleza, inteligência, bom humor, sinceridade. A mesma mulher por quem chorei e senti raiva dezenas de vezes. Ela, que me magoou em diversas discussões e acabou com cada gota de orgulho que eu possuía. Mesmo assim, não havia dúvidas: Alex era a mulher da minha vida.

De repente, eu não me sentia nervoso ou ansioso. Não sentia absolutamente nada além de tranquilidade e alegria

Quanto a Tatiana, ouvi uma única notícia sobre ela depois daquele episódio em minha rua. Tínhamos 16 anos e já não estudávamos na mesma escola. Ela havia fugido com um namorado e a vizinhança toda ficou aflita. Na noite em que ouvi a notícia, pensei em Paula, minha nova paixão, com a certeza tola de que ela nunca me machucaria.