24.12.12

Querido Estranho

Hoje eu pensei em você. Nessa sua vida longe da minha, essa sua rotina que eu não conheço. Considerei seus problemas, aqueles desejos para depois. Hoje, lembrei da gente, eu e você, um tempo breve e passado. Senti saudade, sabe? Fiquei pensando o quanto gosto de você.

É certo que você não se sente assim sobre mim. Quero dizer, eu não posso saber. Talvez você pense em mim, provavelmente com desgosto. Talvez você seja um dos poucos que gostaram de mim. Mas eu gosto, mesmo assim, de você. Você que só lembra do meu nome. Que acha que eu nunca me importei. Você mesmo, com quem eu nunca conversei. Ou então você, com quem tive tanto contato, mas para quem nunca demonstrei. O quanto gosto de você.

Você tem a certeza de que eu nunca parei para olhar você. Enxergar o quanto você é bonito e o quanto eu gostaria de saber mais sobre você. Mas eu paro, sim. Hoje foi um desses dias, um dia para lamentar o quanto o perdi quando perdi você. A oportunidade de te ver, de conversar e conhecer. Já era. Mas a verdade é que eu ainda gosto - e muito - de você.

Espero que você seja feliz. Todas aquelas conquistas, essa vida que você anda construindo. Pode não fazer a mínima diferença, mas eu torço por você. Quando eu sei que você venceu, eu estou aqui, me emocionando e gritando com você.

Não acredita? Tudo bem. Eu nunca quis ser alguma coisa para você. Se um dia teve contato comigo e prestou alguma atenção, sabe que eu sou dessas que fica longe mesmo. No fundo, eu só queria que você soubesse o quando eu gosto de você.

13.12.12

Futuro de Amanda V

Era apego que transbordava dos meus olhos durante a longa tarde em que se fez seu funeral. Apego por ela e tudo o que representava: o amor, a confiança, toda aquela felicidade que agora perdera sentido. E também o futuro.

No começo, soou como um trote mal feito. Chegou por meio de um telefonema e caiu como uma bomba pretensiosa: Amanda se suicidou. Por alguns instantes, não soube se ria ou se ficava bravo, mas um fato agravou a notícia e fez com que parecesse palpável: era a voz da mãe dela, uma pessoa tão dada a piadas quanto um servidor de repartição pública.

Foi assim que a notícia chegou, seca, com uma rasa explicação depois. Um câncer havia sido descoberto, em segredo. Ela escondera os exames, sofrera sozinha. Mas havia espaço para uma batalha, com chances otimistas, e ela se rendeu. Sem buscar ajuda, dar qualquer chance à força e companheirismo dos seus. Nem mesmo a mim.

Ficamos todos à deriva na tragédia, como em pequenos botes individuais e sem remo. Por quê? Desde quando? A culpa é minha? Eu poderia ajudar? Ainda que as perguntas fossem as mesmas para todos, a busca pelas respostas era solitária.

No fim, era inútil. Amanda levara tudo consigo: suas razões, acusações, dúvidas. Sua história e o seu futuro, mesmo que incerto. No meu caso, também o meu futuro. Roubara de mim todos aqueles planos, as expectativas, esperanças -  que não significaram nada quando ela tomou a derradeira decisão. Tudo mentira?

A dor de sua negligência em relação a tudo o que havíamos vivido e prometido juntos era dilacerante, como uma faca que afundava em meu estômago a cada gole de aceitação. Ela não pensou em mim... Pior! Não confiou em mim para assumir sua luta e dividir seu peso. Não, não era mulher forte e determinada, talvez nem mesmo me amasse.

Quando enfim me acomodei na ideia de sua traição, afundado num breu de decepção, sua voz me resgatou. Vinda de um passado recente, revelando sua outra intenção. Um sopro positivo, levemente angustiado, mas afirmativo:

“Eu quero mais. Muito mais.”

Futuro de Amanda I
Futuro de Amanda II
Futuro de Amanda III
Futuro de Amanda IV