3.3.10

Decisão de vida

Ali no morro, Vitor pega a mão de Raíssa, morrendo de medo de estar fazendo alguma coisa errada. Ela usa um vestido azul cheio de flores bordadas na barra e ele a camisa da Igreja, porque é a única que não está furada no sovaco. As estrelas brilham, os grilos cantam aquela musiquinha engraçada e a vista é a mais bonita da cidade. Sob a luz do luar, Raíssa sorri com o mesmo nervosismo que Vitor encosta a mão dele na sua.

- Quer namorar comigo? - ele pergunta, sem olhar para ela.

- Eu quero. - responde a menina, ajetando as dobras do vestido.

Julia observa o morro pela janela de seu quarto. Duas sombras interferem a vista da Lua, juntas demais. Não consegue ouvir o que dizem, mas vê que estão de mãos dadas. Ele, Vitor, e ela, Raíssa. Dois colegas de classe com quem nunca falou na vida.

Deitada em sua cama, ela arranca as páginas de um caderno cor-de-rosa que quando novo exalava cheiro de perfume. As lágrimas percorrem as bochechas inchadas, de criança triste e contrariada. Com um som de rasgo, a folha se solta, amassada, cheia de corações desenhados e letras formando o nome "Vitor". Vitor.

Quando termina o massacre, a menina pega a caneta azul com purpurina e escreve na próxima página em branco, com tanta raiva que a mensagem sai com letras tortas: Eu nunca mais vou amar ninguém.

Fecha o caderno que agora só cheira a sulfite, se enterra no travesseiro e dorme ali mesmo, até o dia seguinte.

2 comentários:

  1. A vida prega peças. Nos lançamos de cabeça num precipício de sentimentos que só percebemos o tamanho da queda quando é tarde demais pra lembrar que pulamos sem para quedas. Mas quem é que quer frear o próprio coração?


    Te amo, Tonbo Chan.

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  2. Seus textos andam muito bons! Você tem seguido um tema e um estilo bem próprios!

    beijos!

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