2.4.10

O Vestido

Quando puxou a cortina bege de lado, algo pinicava em um lugar inalcançável do braço direito. Quatro rostos se iluminaram, colocando-a no centro das atenções. Suas melhores amigas, sua irmã e sua mãe, esta última à beira de lágrimas.

Havia um banco no centro de três altos espelhos e uma moça baixa aguardando com a fita métrica pendurada no pescoço. Ela sorriu de leve e lhe estendeu a mão, para ajudar a subir no banco sem rasgar o vestido. Claro, o vestido.

O alvo branco brilhou em um raio de Sol que entrava pela janela. O tecido escorria liso até o chão mesmo contando a altura do banco e, nos seios, pequenas flores subiam bordadas pelos cantos, ornadas com contas peroladas. O tomara-que-caia valorizava muito bem seu colo e fez as quatro espectadoras suspirarem.

À sua frente, três imagens oscilavam, vestindo seu vestido, balançando seu véu, mascaradas com sua maquiagem. Eram lindas, as três, tanto quanto diferentes. A primeira, que mostrava o ângulo direito do vestido, achava-se fabulosa. Sorria em plena felicidade e ansiedade. Era a pura, menina virgem, cheia de sonhos, planos e antecipações.

A segunda, do meio, era a que a encarava diretamente nos olhos. Era questionadora, séria e rígida, como uma professora zangada. Parecia julgá-la com superioridade, cheia de dúvidas sobre aquele lugar em cima do banco. O que aquilo significava? Os rostos chorosos, sorrisos largos, gritinhos de excitação? O que significaria, afinal, tanta emoção? Um vestido, símbolo de quê exatamente?

A última, da esquerda, era radical. Fantasmagórica, transbordava raiva e rancor. Odiava seu lugar dentro do vestido cerimonial, o corpo sufocado por um momento vazio. Cuspiria na cara emocionada da mãe, da irmã, das amigas. Sairia nervosa em direção à rua e jamais voltaria. Não em sã consciência.

A ocasião se passou em meio a comentários românticos, às vezes amargos, às vezes invejosos. As mulheres juntas tendiam a falar de homens e da vida alheia. A festa por vir as encantava tanto que as deixavam tagarelas mesmo nos momentos em que os assuntos morriam. A costureira trabalhava sem parar em detalhes invisíveis.

- Você é a noiva mais linda.

Ela sorriu, de costume. Deu uma volta, para encerrar o show. Quando saiu do vestido – com cuidado, é claro – se viu sentindo apenas uma coisa: alívio por se livrar da pinicada no braço.

Mais tarde, quando a agenda do dia havia acabado, pôde encontrar Diego na entrada do barzinho favorito. Ele lhe sorriu, daquele jeito que a conquistava toda e cada vez, e ela o abraçou. Forte o suficiente para saber que não queria se casar. Não queria o casamento.

Era aquele abraço: quente, apertado, íntimo. Era ele que satisfazia a menina sonhadora, calava a ansiedade questionadora e acalmava seu lado mais radical. Era ele, e somente ele que fazia qualquer sentido.

Mais nada.

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